1.06.2009

A CADEIRA DE BALANÇO por Angelina Iglesias Veiga

Todo fim de ano, era a mesma rotina: passar as festas na casa das tias solteiras. Eu era ainda bem pequena mas minha mãe fazia uma listagem das coisas que eu podia ou não devia fazer. E também, de como eu deveria me comportar: cumprimentar as tias pedindo-lhes a bênção, dizer obrigada, com licença, por favor... Não abrir armário, não pedir comida – esperar que me oferecessem ... Nunca me intrometer na conversa dos grandes e nem ficar por perto quando estivessem conversando...
Quando eu cresci, minhas irmãs e eu sabíamos de cor as tais recomendações. Ah! Esqueci de dizer que além de nós, todos os sobrinhos com os pais também para lá se dirigiam para os festejos natalinos. Era o momento do reencontro de toda a família. Era tanta gente, que, na hora do banho, fazíamos uma imensa fila e uma enorme bagunça.
Era a época dos risos e alegrias. E dentre tanta felicidade, o que eu mais gostava era quando a minha família chegava antes dos outros tios e nós íamos esperá-los na estação de trem. Íamos de charrete, cantando e rindo a não poder mais.
Agora, percebo, como era importante para as tias a nossa presença: elas começavam a se preparar meses antes: faziam tachos de doces variados para nos esperar; recortavam papéis de seda coloridos com tanto esmero e cuidado e, com eles, enfeitavam as bandejas e prateleiras. E as quitandas, então! Que delícia! Minha boca está cheia d’água só de lembrar...
Quase tudo era permitido às crianças: a única exceção era um objeto que existia na imensa sala principal: uma pomposa cadeira de balanço com palhinha no assento e no encosto. Nela, ninguém podia sentar-se. Bastava alguém caminhar em sua direção que já se ouvia um estridente grito. Seguia-se, então ao relato do fato mais importante, na opinião das tias, do que aconteceu em nossa família: o Imperador, D. Pedro II, em visita à fazenda, sentara-se naquela cadeira. Desde então, ela fora preservada para que todos soubessem da importância que a família gozara tempos atrás. Os primos combinavam de fazer de conta que íamos nos balançar na cadeira só para as tias contarem a história que conhecíamos de trás prá frente. Penso que muita coisa elas até aumentavam, mas, elas se sentiam tão importantes, que esta era a nossa maneira de também deixá-las felizes.
De repente, ao me lembrar dessa história, percebi que quase todos já partiram. Nos que restam, doença, tristeza, solidão, palavras que não faziam parte da nossa vida e nem do nosso vocabulário. Que saudades das brincadeiras, alegrias, esperanças... Não estarmos juntos no próximo Natal? Jamais passou pela minha cabeça.
E a cadeira, você pode estar se perguntando. Os cupins deram fim nela. Atualmente, ela só existe imponente e majestosa na minha memória.
Infelizmente outros cupins também deram fim na família que um dia recebeu a visita do Imperador.